terça-feira, 14 de setembro de 2010

Histórico do Autor

Poeta e Romancista, nascido nas diferentes plagas desta imensidão amazônica. Dedica-se a poesia desde sua adolescência, tendo como inspiração maior a vida.
Membro de diversas entidades literárias, União Brasileira de Trovadores - Ananindeua. Associação Paraense Literária Interiorana, etc.
Participa da Antologia "A Nova Poesia Brasileira, com o poema " Neutralidade".

Pensamento

Torna-se um tanto difícil a compilação de textos romanceados. Mais quando o próprio autor encarrega-se de tal façanha, isto pode ser confirmado por todos aqueles que um dia aventuraram fazê-lo.

sábado, 9 de janeiro de 2010

Perfil de Eron

“O escritor é um maldito”

Eron de Carvalho acredita na subjetividade da poesia. Antes mesmo da entrevista começar, ele já mostrava um poema, rabiscado horas antes, como se fosse um cartão de visitas. “Veja só”, ele me disse, escolhendo um verso aleatoriamente. Leu-o. “Não vou olhar”, prometeu, e deslizou o dedo às cegas pelo papel, até um verso no extremo oposto. Declamou-os juntos, e faziam perfeito sentido. Eron ainda repetiu a prática usando outros versos, talvez pensando que eu não entendera. Mas o significado era claro. Para ele, a verdadeira poesia não está na escrita e idealização do autor, mas na leitura e entendimento do leitor.

Encontrei o poeta e romancista sozinho, em uma mesa abandonada, no pouco visitado estande de escritores paraenses da XIII Feira Pan-Amazônica do Livro. Eron parecia desesperado para falar com alguém que não estivesse ali apenas para comprar “Crepúsculo” em promoção. Eu – que mais tarde procuraria livros de Neil Gaiman, sem sucesso – certamente me encaixava na definição. Foram duas horas de diálogo, e poderia ter sido mais.

A conversa informal com que eu planejava iniciar, para que pudesse me ambientar com o entrevistado – dica da jornalista Thaís Oyama em seu fantástico “A arte de entrevistar bem” – foi encurtada. Eron pareceu se empolgar por ter uma audiência atenta, mas, afinal, ele não falava com Truman Capote. Puxei o gravador. Para minha surpresa, o poeta não se intimidou. Ajeitou-se na cadeira, como quem se prepara para uma longa viagem de carro, e continuou a arremessar suas histórias, que eu tinha de rebolar para capturar.

O homem pirata e o menino poeta

Eron de Carvalho começou a escrever com 15 anos de idade. E como muitos jovens poetas, começou por “culpa” de uma garota pela qual era apaixonado. Ou melhor, é. “As paixões não morrem”, acredita. “Elas simplesmente são sufocadas por uma outra paixão”. E o garoto Eronílio, apaixonado, escrevia. Presenteou o seu amor adolescente – cujo nome ele não revela – com um diário, introduzido por seu primeiro poema.

Antes disso, o menino nem mesmo era Eronílio. Quando nasceu, seu nome era Expedito. Filho do marítimo César – regular nos navios da extinta Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro e náufrago de guerra no ataque dos submarinos alemães de 1942 –, o menino foi criado pela mãe, Dona Pedra. “Meu pai era um homem do mar, então nós éramos uma infinidade de irmãos”, revela. Eron sabe da existência de oito – divididos entre cinco mães –, mas conhece apenas quatro. Contando com ele, são nove meio-irmãos por parte de pai, com seis mães diferentes. No entanto, Seu César o visitava sempre que podia. E foi ele, por meio de uma carta, que escolheu seu nome. O menino que todo mundo já se acostumara a chamar de Expedito ganhou também o nome de Eronílio, uma homenagem bem brasileira do pai para seus dois ídolos: o eterno Robin Hood dos cinemas, o australiano Errol Flynn; e o escritor americano Eugene O’Neill, vencedor do Prêmio Nobel de Literatura de 1936.

Eronílio Expedito de Carvalho nasceu em um antigo hospital de guerra, onde hoje fica o Pronto-Socorro da 14 de março, no dia 24 de setembro de 1945. O menino passou a infância no bairro da Pedreira. Lá, conheceu um homem aparentemente irrelevante, um vendedor com um membro de madeira. Eronílio, com a crueldade ingênua que só crianças têm, chamava o vendedor de pirata.

Alguns anos depois, quando já era um garoto de 15 anos, vivendo a magia da paixão adolescente e traçando seus primeiros versos, Eronílio reencontrou o vendedor. “Ele bateu no meu ombro, ele lembrou de mim”, conta. O garoto, que escrevia para uma leitora só, foi surpreendido pela saudação do pirata. “Ô poeta, como é que vai?”

Vida e obra

Eron de Carvalho é um homem dedicado e decidido. Para alcançar o sonho de ser escritor, ele trabalhou por seis anos na Associação dos Magistrados do estado do Pará e foi até balconista de supermercado. “O escritor é um maldito”, ironiza, se referindo à dificuldade de fazer da literatura uma profissão.

Embora tenha demorado a realizar seu sonho, Eron não desperdiçou a vida atrás dele. Pelo contrário. Morou por dez anos no Rio de Janeiro, em Duque de Caxias. Formou-se em Jornalismo pela Escola Assis Chateaubriand. Casou-se duas vezes e teve quatro filhos. O poeta diz que “não adianta ficar chupando o caroço da manga se não tem mais gosto”, frase concebida por seu velho amigo, o contista paraense Lucinerges Couto – pai do atual prefeito de Marituba, Bertoldo Couto.

A obra poética de Eron de Carvalho consiste em dois livros. “Poemas para meditar”, de 1999, e “Desaguar”, de 2005, lançado oficialmente na IX Feira Pan-Amazônica do Livro. Ambos tiveram tiragem muito reduzida e estão esgotados. O próprio autor não possui mais nenhum.

Desde 2005, Eron se envolveu com romances. Já escreveu três, mas nenhum foi publicado. Os dois primeiros ele nem mesmo nomeou, na descrença de um patrocínio. O terceiro, “A saga de Tati Pupupu”, está concorrendo ao patrocínio do Banco da Amazônia. Os olhos de Eron brilham enquanto ele antecipa o enredo do livro, terminado recentemente. Ele se emociona ao narrar os desencontros dos protagonistas Tatiana e Ernesto. “Olha aí o que acontece”, diz, apontando para as lágrimas que se formam nos olhos, já profundamente vermelhos.

Velho escritor vivo

Eron de Carvalho é, acima de tudo, um homem reconhecido em seu meio. Enquanto conversamos, ele foi abordado por Juracy Siqueira, Luiz Peixoto Ramos – o Jabutigão – e Márcio Santos, com quem debatemos significativamente sobre a literatura paraense e seu ínfimo reconhecimento, pelo menos por parte do grande público e da grande imprensa. “Infelizmente, no Pará, escritor tem que morrer pra aparecer”, disse Márcio, que tem seu argumento amparado na própria Feira do Livro, cujo homenageado é o falecido Dalcídio Jurandir.

Cada um desses escritores, quando via que eu era jornalista – ou protótipo de um – me convidava para sua exposição. Jabutigão, com sua fantasia discretíssima, disse “ lá na JP Gonçalves!”. Juracy Siqueira e seu chapéu de palha propagandearam o último trabalho. Márcio Santos fez fotos e me deu o endereço de seu blog. Os nossos poetas, contistas e romancistas estão carentes de exposição. Exceto Eron de Carvalho.

Após a entrevista, ao invés de sair quase correndo para outro estande, como seus colegas, Eron continua ali, sentado. O senhor de 64 anos, que – só agora eu percebia – parecia extenuado, representa muito mais do que eu imaginara. Ele não é apenas fundador da Associação de Letras e Artes de Ananindeua, co-fundador da Academia Paraense Literária Interiorana e membro da Associação Paraense dos Escritores e da União Brasileira dos Trovadores. Eron de Carvalho é um mentor para muitos de nossos escritores que hoje batalham pela sobrevivência na profissão. E eu não pude deixar de pensar, enquanto ia embora, testemunha da felicidade repugnante que se alastrava pelos mais novos donos de exemplares de “Crepúsculo”, no quanto aquela tarde havia valido a pena. No quanto Eron de Carvalho poderia ter valido muito mais a pena, se prestássemos atenção nele há mais tempo. E no quanto ele ainda pode valer a pena, se apenas passarmos a tratá-lo com a importância que merece.


Trabalho apresentado a Universidade da Amazonia

Turma Comunicação Social - Jornalismo

Executado por Giovanni Guerreiro

Perfil do Escritor Ananindeuense Eron de Carvalho